domingo, 3 de julho de 2016

A fuga



A vida deve ser um equilíbrio entre o mundo “concreto” (aquele socialmente aceito) e o nosso mundo imaginário. A maioria de nós paira sobre estes dois mundos o tempo todo... por exemplo: quem nunca desintegrou outra pessoa no seu mundo imaginário ou teve romances incríveis. Algumas pessoas mais sensíveis geralmente sucumbem ao mundo imaginário pois ele é bem menos cruel do que a nossa tosca realidade. Essa história se passa nesse mundo imaginário.
As pessoas acham que se conhecem, mas como isso é possível, se todos os relacionamentos passam apenas no mundo concreto. O que se passa no nosso imaginário é tão particular de cada indivíduo que deve ser apenas do conhecimento do Criador. Um certo dia, chateado com o cotidiano desse mundo cão chamado real, viajei para o meu universo paralelo (acho que esse é um dos maiores poderes que o pensamento nos proporciona). E lá estava ela. Crítica, discreta, ou pelo menos era o que eu sentia dela, mas com um senso de justiça que me intrigava e mexia comigo. Malena, vamos chamá-la assim, aquele perfil que o ocidente idealizou de uma ateniense, nem era preciso fazer correção alguma no “photoshop” da imaginação, bastava lembrar da sua imagem do mundo real. Mas algo estava mudando no meu mundo. O equilíbrio entre o real e o imaginário (Pasárgada) estava pendendo para o mundo onde eu podia ver a bela... E esse é a verdadeira armadilha do mundo imaginário que torna muitos de nós chamados de “malucos”, pois a musa imaginária sempre será melhor que a real. Lá em Pasárgada, Malena foi algo tão profundo que me tocou como nunca. Mas como stalkear alguém que conhecia apenas de vista e de uma troca de questionamentos num seminário sobre corrupção. Nada como a internet de Pasárgada, e lá estava algumas coisas da Bela. Não participava de redes sociais pois não tinha tempo para tal, estava no pós-doutorado de direito internacional e estava numa cruzada contra a corrupção. Nem era jornalista de formação, mas seus dois livros foram best seller em 22 países em menos de 3 anos. Suas paixões declaradas eram vinhos, livros e viagens. E eu cada dia me sentia atraído por essa desconhecida que parecia ser um amor de outra vida. Em Pasárgada eu era um jornalista político investigativo, bem diferente da vida chatérrima da realidade onde era um temido gerente de finanças. Sabia que era um babaca, meus funcionários não me respeitavam, apenas temiam e o meu casamento por interesse era patético, uma vez que a minha mulher simplesmente me ignorava como pessoa e eu era tratado como um escravo. Mas isso foi fruto de uma escolha covarde. Mas a vida parece a enchente de um rio, e podemos represar ou desviar, mas uma hora, toda a força se revela e as águas seguem o seu rumo vencendo tudo. Era assim que eu me sentia, com a vida “real” toda estruturada, cada dia eu fugia mais ainda para Pasárgada, no início apenas no silêncio da hora de dormir, mas a medida de que as coisas iam me aproximando de Malena, eu fugia cada vez mais... nas mais variadas horas. Isso foi transformando minha vida aqui fora num caos, mas nem ligava muito, sempre podia ir para Pasárgada. No início era apenas com o pensamento, mas agora com auxílio de um remédio para dormir e o tempo de sono aumentava cada vez mais. Certo dia estava em Pasárgada, ia encontrar Malena em Alexandria. Tudo foi cuidadosamente planejado, queria mostrar os escombros do fora o maior centro de saber do mundo antigo e depois iríamos passar a noite num acampamento para observar o céu no deserto. Meu único problema era ser perseguido por uma mafiosa da américa latina devido a uma denúncia feita por mim anos atrás. Por causa disso, eu sempre monitorava os movimentos dos seus principais capangas. Um deles era Dionísio, um matador de aluguel que agora trabalhava apenas para a mafiosa. Mas o último informe de um amigo da Interpol dizia que eles estavam numa pista falsa que eu havia implantado algumas semanas no Canadá. Mas voltemos ao encontro com Malena. Já se passava das 9 horas de uma noite bem fria nesse deserto, devias estar uns 10 º. Estávamos os dois um do lado do outro, deitados numa esteira térmica sobre uma duna observando a constelação de Órion (era a única que eu sabia...rsrs) de mãos dadas, eu sentia um calor intenso com a proximidade de Malena contrastando com frio intenso do deserto. Ela vira seu rosto e nós damos um beijo cálido, quase de primeira vez, e eu profundamente extasiado em ver o que estava acontecendo. Nos beijamos de forma mais intensa, ela passa a mão na minha nuca e eu sinto uma leve picada e perco os sentidos. Horas mais tarde acordo com uma sensação de ressaca, terrível, e vejo Malena abraçada a Dionísio. Estava sendo levado para o covil da mafiosa. Uma dor terrível tomou conta do meu peito e ficava me perguntando como tudo deu errado num mundo da minha imaginação. Por que estava sendo traído por quem eu mais havia idealizado e ainda entregue aos meus inimigos?! Queria morrer pois não havia mais outro lugar para escapar. Pasárgada era o refúgio ideal da vida patética que eu levava devido as minhas escolhas. Me perguntava o que deu errado enquanto era levado para a Mafiosa. Quando dou de cara com a minha algoz! Agora  ouço as respostas que achava que não tinha. A mafiosa era na verdade a minha mulher da vida real e tudo que estava acontecendo era um distúrbio no espaço tempo da realidade com o imaginário, que as pessoas mais antigas chamavam de remorso. O que Malena e Pasárgada faziam eu sentir agora era o mesmo que eu fazia com as pessoas no mundo real. Mas agora eu não tinha um lugar para escapar.... tanto o real como meu imaginário se tornaram meu inferno. E eu achava que Deus não existia... e não conseguia me livrar daquela angústia em nenhum dos mundos....

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